domingo, 28 de fevereiro de 2010

O MITO DA CAVERNA



E agora, deixa-me mostrar, por meio de uma comparação, até que ponto nossa natureza humana vive banhada em luz ou mergulhada em sombras. Vê! Seres humanos vivendo em um abrigo subterrâneo, uma caverna, cuja boca se abre para a luz, que a atinge em toda a extensão. Aí sempre viveram , desde crianças, tendo as pernas e o pescoço acorrentados, de modo que não podem mover-se, e apenas vêem o que está à sua frente, uma vez que as correntes os impedem de virar a cabeça.
Acima e por trás deles, um fogo arde a certa distância e, entre o fogo e os prisioneiros, a uma altura mais elevada, passa um caminho. Se olhares be, verás uma parede baixa que se ergue ao longo desse caminho, como se fosse um anteparo que os animadores de marionetes usam para esconder-se enquanto exibem os bonecos.
[...] Pois esses seres são como nós. Vêem apenas suas próprias sombras, ou as sombras uns dos outros, que o fogo projeta na parede que lhes fica à frente."
Platão, República, Livro 7
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Platão (c.428-348 a.C.) não achava que este era o melhor dos mundos. É uma espécie de prisão, escreveu ele, onde estamos trancafiados em escuridão e sombras. Mas além dessa prisão reside um brilhante e esperançoso mundo de verdades que ele chamou de idéias ou ideais, e é por isso que chamamos essa doutrina de idealismo.
Platão desenvolve suas doutrinas idealistas de forma notável na República, onde seu porta-voz, como de hábito, é seu mestre, Sócrates. (Desconhece-se até que ponto Sócrates realmente sustentava os pontos de vista de Platão.) Sócrates compara nosso mundo cotidiano a um "abrigo subterrâneo", uma caverna onde somos mantidos acorrentados. À nossa frente ergue-se uma parede e atrás de nós, uma fogueira. Incapazes de virar a cabeça, vemos somente as sombras projetadas na parede pelo fogo. Nada conhecendo além disso, naturalmente tomamos essas sombras por "realidade". Os seres humanos, nossos companheiros, assim como todos os objetos da caverna, para nós não passam de sombras; não têm, para nós, outra realidade além dessa.
Mas se pudéssemos nos libertar das correntes, se pudéssemos ao menos nos virar para a entrada da caverna, poderíamos constatar o nosso erro. A princípio, a luz direta nos seria dolorosa e perturbadora. Porém, logo nos adaptaríamos e começaríamos a perceber as pessoas e objetos reais, que só conhecíamos em forma de sombras. Mesmo assim, devido ao hábito, nos agarraríamos às sombras, ainda acreditando que elas fossem reais, e suas fontes, apenas ilusões. Mas se fossemos tirados da caverna para a luz, cedo ou tarde chegaríamos à visão correta das coisas e lamentaríamos nossa antiga ignorância.
A analogia de Platão é um ataque aos nossos hábitos de pensamento. Estamos acostumados, diz ele, a aceitar os objetos concretos que nos cercam como "reais". Mas eles não são. Ou melhor, eles são só cópias imperfeitas e menos "reais" de "formas" imutáveis e eternas. Essas formas, como Platão as define, são as realidades permanentes, ideais e originais a partir das quais (de alguma forma) são construídas cópias concretas imperfeitas e corruptíveis. Por exemplo, cada cadeira em nosso familiar mundo de objetos é meramente uma imitação, ou "sombra", da Cadeira Ideal. Cada escrivaninha é uma cópia da Escrivaninha Ideal, que nunca muda, que existe pela eternidade, e na qual você nunca pode derramar café.
Essas cadeiras e escrivaninhas ideais, segundo Platão, não são fantasias; elas são de fato mais "reais" que suas imitações materiais, porque são mais perfeitas e universais. Entretanto, como nossos sentidos corrompidos têm sido sempre enganados, nós somos cegos para o mundo dos ideiais. Nossas mentes estão escravizadas a imitações que nós, desta maneira, confundimos com a realidade. Somos prisioneiros em uma caverna filosófica.
"no mundo do conhecimento, a idéia do bem aparece por último e é percebida apenas com esforço; mas, quando percebida, torna-se claro que ela é a causa universal de tudo que é bom e belo, o criador da luz e o senhor do sol neste mundo visível."

GABARITO DO CFI - PS1 - APLICAÇÃO 26/02/2010





GABARITO DO 1 ANO

1 - B / 2 - B / 3 - A / 4 - V,V,F,F,V / 5 - B / 6 - D / 7 - ABERTA / 8 - E

GABARITO DO 2 ANO

1 - A / 2 - E / 3 - ABERTA / 4 - E / 5 - C / 6 - D / 7 - A / 8 - D

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Enem muda perfil de feras



Alguma coisa acontece no#vestibular. O verso da música "Sampa", de Caetano Veloso, quando parafraseado, espelha bem a situação por que passa o processo seletivo da Universidade Federal de Pernambuco. Que o vestibular mudou, não há dúvidas. É só ter um olhar mais acurado para comprovar: o listão está de cara nova. A lista dos dez primeiros colocados, divulgada um pouco antes do carnaval, acirrou a disputa entre as áreas de humanas e exatas. E quem ganhou o round, desta vez, foi o time de humanas - uma situação inédita pela menos nos últimos oito anos. Seis (cinco deles de direito) figuraram lá na frente e, além disso, a primeira colocada, a estudante Bárbara Buril, foi de jornalismo. Medicina? Ninguém entre os 10 primeiros. Daí fica a pergunta: que furacão passou para varrer candidatos de cursos mais concorridos do mapa da liderança do vestibular mais importante do estado?
Reitor da UFPE, Amaro Lins, vai decidir se adere integralmente ao Enem Foto: Helder Tavares/DP DA PressA teoria mais provável entre professores é que o Enem tenha sido o elemento novo que revolucionou aforma de selecionar universitários. "Antigamente, a primeira fase do vestibular da UFPE era muito simples e os alunos de medicina tiravam as notas mais altas", recorda Eduardo Belo, diretor do Colégio Motivo, em Boa Viagem. "Então os primeiros colocados da primeira fase, que tinham um perfil de estudo mais conteudista, acabavam com um resultado geral melhor", teoriza. Belo lembra que a maior nota do Enem em Pernambuco foi 8,4. Ninguém tirou mais de nove, como era comum na década de 1990 pela Covest. "A nota caiu porque o Enem tem provas mais massudas, com mais questões. E, por isso, é mais cansativa", observou."Pensamento crítico" pesou? - O que poderia explicar a supremacia dos candidatos de humanas sobre os de saúde e humanas seria o novo formato do Enem, que valoriza aqueles candidatos que conseguem fazer correlação e interpretação crítica de fatos e dados. A questão é que o vestibular da Covest já fazia isso antes. Pelo menos dos anos 2000 para cá, a interdisciplinaridade em provas como a de história jáera bastante explorada. Porém, nos últimos três anos, os primeiros colocados foram de exatas. "Antes a 1ª fase tinha 80 questões em um único dia. E cobrava um perfil mais conteudista, decoreba. Os alunos de humanas foram favorecidos porque têm um nível de leitura do dia a dia maior", opinou o professor Eduardo Belo.Já o diretor do Colégio Boa Viagem, George Diniz, discorda. Para ele, essa visão de que os candidatos das áreas de saúde e exatas têm uma preparação mais esquemática não reflete a situação em geral. Diniz tem outra opinião sobre o revertério no vestibular. Ele acha que o que pesou mais foi o grau de dificuldade nas provas da 2ª fase. "Os testes de biologia e química estavam muito complexos. E isso afetou diretamente a nota dos candidatos de medicina", disse. Diniz, no entanto, não se arriscou em dizer se o vestibular continuará atípico nos próximos anos. "Não sabemos se a UFPE continuará com o Enem", justificou.O reitor Amaro Lins ainda não decidiu se manterá o Enem como substituto da 1ª fase ouse irá aderir ao Sistema de Seleção Unificada, o SisU, escolhido por 51 instituições até agora. Sem se referir a uma data, disse que em breve vai se reunir com o comitê de governança, em Brasília, e com representantes da Covest para chegar a um consenso. Amaro, porém, tranquilizou os feras dizendo que a preparação deve continuar focada no Enem.

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Confraria dos Professores - 2010


The yes men: a arte de dizer não aos abusos corporativos




Para salvar os recentes fóruns oficiais do completo marasmo e seguirem desmascarando a lógica neoliberal de forma sarcástica, a dupla de ativistas do The Yes Men, Jacques Servin e Igor Vamos (codinomes Andy Bichlbaum e Mike Bonanno), agitou Copenhagen e deu o ar de sua graça em Davos.

Ao longo de mais de dez anos de militância, os Yes Men já ridicularizaram a Organização Mundial do Comércio; desmoralizaram a Exxon e a Halliburton; lançaram um plano habitacional para os desabrigados do furacão Katrina; produziram uma edição falsa do NYT; provocaram uma baixa nas ações da gigante Dow, dentre outras pérolas do ativismo contemporâneo.

No front ambientalista, o coletivo focou no Canadá, que ocupa uma das piores posições entre os países signatários do Protocolo de Quioto e aumentou em quase 30% suas emissões de gases causadores do efeito estufa em relação a níveis de 1990. Um dos motivos é a extração de petróleo das imensas areias betuminosas na província de Alberta — cada barril de betume produz três vezes mais gases-estufa que um barril de petróleo convencional.

Com o objetivo declarado de denunciar os desmandos da política ambiental canadense, uma coalizão formada pelo The Yes Men e pela Action Aid International, forjou, em nome do ministério do meio ambiente do Canadá, uma proposta radical de corte de 40% nas emissões de carbono abaixo dos níveis de 1990 até 2020, além de um aporte de 13 bilhões de dólares para ajudar os países africanos na redução de emissões dos gases de efeito estufa. Os releases da proposta, lançados durante uma coletiva na Cúpula do Clima em Copenhague vinham assinados e timbrados com a chancela do governo do Canadá.

Os efeitos, inclusive midiáticos, daquilo que poderia ter sido verdadeiro, mas que na realidade não foi nem sequer cogitado oficialmente, enfureceu o primeiro-ministro canadense Stephen Harper, mas ajudou a expor as reais prioridades dos países ricos presentes na COP15.
Da Dinamarca para os Alpes suíços. Enquanto a 40ª edição do Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça, se arrastava da mesma forma previsível e melancólica, apenas com mornas medidas de controle financeiro para salvar o sistema capitalista, a dupla dinâmica do The Yes Men criava um site paralelo do Fórum. Na verdade é uma página falsa do Fórum de Davos (we-forum.org), onde celebridades globais, como que por encanto, assumem discursos progressistas.

A Rainha Elizabeth, por exemplo, aparece no site dizendo estar empenhada “na erradicação dos padrões colonialistas que continuam ainda hoje, e que só pioraram sob o regime neoliberal”. O ex-presidente estadunidense Bill Clinton, a chanceler da Alemanha Ângela Merkel, dentre outros, fazem coro à monarca, graças às dublagens perfeitas implantadas sobre os vídeos oficiais fornecidos pelo próprio Fórum de Davos.


Todo cartunista e caricaturista sabe que o exagero nas formas ajuda a penetrar mais profundamente na matéria. Entretanto, os Yes Men acrescentam à tradicional caricatura um raro oportunismo jornalístico, potencializado por um uso particularmente criativo da internet.

Não se limitam a reagir diante do descalabro capitalista. Criam um novo fluxo midiático a partir de uma performance ativa que, via de regra, utiliza as próprias armas do inimigo. O objetivo das ações é operar uma espécie de correção da realidade. Foi assim em sua ação mais ousada.

O 20º aniversário do desastre de Bhopal, na Índia, tinha tudo para cair no esquecimento. Entretanto, uma ação midiativista reverteu a situação e recolocou em pauta o maior desastre ambiental da história. Um produtor da BBC World, pesquisando a catástrofe, entrou no site DowEthics.com e, sem prestar atenção ao seu conteúdo, mandou no dia 29 de novembro de 2004 um e-mail, solicitando uma entrevista sobre a posição da Dow diante da tragédia ocorrida em 1984. O detalhe é que DowEthics.com não é o site oficial da companhia, mas um trabalho de hacktivismo do The Yes Men, que ao receber o pedido da BBC, decidiu levá-lo a sério. O coletivo solicitou que fosse agendada uma entrevista num estúdio em Paris, onde um “porta-voz” da empresa daria uma entrevista.

Com o nome fictício de Jude Finisterra, o “porta-voz” (interpretado por Andy Bichlbaum) falou à BBC World durante oito minutos para um público potencial de 300 milhões de espectadores. Finisterra foi peremptório ao afirmar que a Dow Chemical finalmente aceitava a responsabilidade total pelo desastre de Bhopal e anunciou um fundo de 12 bilhões de dólares para indenizações às vítimas. "Resolvemos liquidar a Union Carbide, este pesadelo para o mundo e esta dor de cabeça para a Dow. Vamos usar os 12 bilhões de dólares (obtidos) para dar mais de 500 dólares por vítima, que é o que elas têm recebido", explicou Finisterra. A notícia se espalhou rapidamente e as ações da Dow caíram 3,4% na bolsa de Frankfurt e 5 centavos de dólar na bolsa de Nova York.

As ações do coletivo são financiadas por uma rede de simpatizantes do mundo todo e por produções da própria dupla, como os dois filmes: The Yes Men (2004) e The Yes Men concertam o mundo (2009) — vencedor do Panorama Audience Award do Festival de Cinema de Berlim, em 2009. Neste último, dirigido pela dupla em colaboração com Kurt Engfehr (editor do cineasta Michael Moore), os ativistas reflerem sobre os desdobramentos das próprias operações, além de mostrarem os bastidores das recentes atividades do grupo, que registra tudo em vídeo.

Em New Orleans, por exemplo, Andy Bichlbaum fingiu ser Rene Oswin, secretário-adjunto do Ministro da Habitação do ainda presidente George Bush. O falso secretário apresentou-se numa conferência transmitida ao vivo pela CNN, e afirmou que a Exxon e a Shell investiriam 60 milhões de dólares na reconstrução dos bairros atingidos pelo furacão Katrina. Depois de serem desmascarados, os Yes Men organizaram um churrasco para comemorar os “novos planos do Ministério”. A população foi convidada e a mídia local rotulou de cruel e perversa a ousadia do coletivo de “brincar com coisas sérias”. Patricia Thomas, desabrigada e antiga moradora do bairro Lafitte, saiu em defesa da performance em resposta a uma repórter de TV. “Eu respeito esta brincadeira porque é exatamente o que precisava ser feito para que eles se interessassem pela nossa situação. Se é necessário pregar uma peça para que isso aconteça, então está ótimo. Agora me deixe comer o churrasco”, concluiu Patricia, despachando a repórter ao som de uma banda de jazz.



Silvio Mieli é jornalista e professor universitário

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Sites importantes

http://karlamoraessociologia.blogspot.com/2009/03/estratificacao-social-estratificacao.html

http://www.espacoacademico.com.br/023/23res_pinsky.htm

A Formação da Sociologia


A Formação da Sociologia

No final do século passado, o matemático francês Henri Poicaré referiu-se à sociologia como ciência de muitos métodos e poucos resultados. Ao que tudo indica, atualmente poucos duvidam dos resultados alcançados pela sociologia. A sua realidade é atestada pelas inúmeras pesquisas dos sociólogos, pela sua presença nas universidades e empresas e nos organismos estatais. Ao lado desta crescente presença da sociologia no nosso dia-a-dia, continua porém chamando a atenção de todos os que se interessam por ela os freqüentes e acirrados debates travados em seu interior sobre o seu objeto de estudo e seus métodos de investigação.
A falta de um entendimento comum entre os sociólogos sobre a sua ciência possui, em boa medida, uma relação com a formação de uma sociedade dividida pelos antagonismos de classe. A existência de interesses opostos na sociedade capitalista penetrou e invadiu a formação da sociologia. Este contexto histórico influenciou enormemente suas visões sobre como deveria ser analisada a sociedade, o que refletiu também no conteúdo político de seus trabalhos. Este antagonismo deu origem ao aparecimento de diferentes tradições sociológicas ou distintas sociologias como afirmam alguns sociólogos. Não podemos esquecer que a sociologia surgiu num momento de grande expansão do capitalismo e por isto mesmo alguns sociólogos otimistas assumiram, diante da sociedade capitalista nascente, que os interesses e os valores da classe dominante eram representativos do conjunto da sociedade e que os conflitos entre as classes sociais eram passageiros.
Os conservadores chamados de “profetas do passado” construíram suas obras contra a herança dos filósofos iluministas. Não eram intelectuais que justificavam a sociedade por suas realizações políticas ou econômicas. Ao contrário, a inspiração do pensamento conservador era a sociedade feudal, com sua estabilidade e acentuada hierarquia social. Não se interessavam em defender uma sociedade moldada nos princípios defendidos pelos iluministas nem um capitalismo que se transformava mostrando sua faceta industrial e financeira. O fascínio que as sociedades da Idade Média exercia sobre estes pensadores conferiu-lhes e às suas obras um forte sabor medieval. Por interesse direto, alguns deles eram defensores ferrenhos das instituições religiosas, monárquicas e aristocráticas em franco processo de desmantelamento.
As idéias dos conservadores eram um ponto de referência para os pioneiros da sociologia, interessados na preservação da nova ordem econômica e política que estava sendo implantada. Adaptando, inclusive, algumas concepções dos “profetas do passado” às novas circunstâncias históricas, pela impossibilidade total de retorno ao passado. É entre os autores positivistas, como Saint-Simon, Auguste Comte e Emile Durkheim, que as idéias dos conservadores exerceriam uma grande influência. É comum encontrarmos a inclusão de Saint-Simon (1760-1825) entre os primeiros pensadores socialistas. Foi considerado o “mais eloqüente dos profetas da burguesia”, um grande entusiasta da sociedade industrial. Todavia, entendia que o problema da restauração da ordem devia ser enfrentado, porque a sociedade francesa pós-revolucionária parecia-lhe “perturbada” pois nela reinava um clima de “desordem” e de “anarquia”.
Saint-Simon acreditava que a nova época era a do industrialismo, que trazia consigo a possibilidade de satisfazer todas as necessidades humanas e constituía a única fonte de riqueza e prosperidade. Percebeu que no avanço que estava ocorrendo no conhecimento científico havia uma grande lacuna, nesta área do saber, qual seja, a inexistência da ciência da sociedade. Admitia, mesmo tendo uma visão otimista da sociedade industrial, a existência de conflitos entre os possuidores e os não possuidores.
Várias das obras de Saint-Simon seriam retomadas por Auguste Comte (1798-1857) seu secretário particular, pensador menos original, embora mais sistemático que Saint-Simon, a quem deve suas principais idéias. A motivação da obra de Comte repousa no estado de “anarquia” e de “desordem” de sua época histórica. Segundo ele as sociedades européias encontravam-se em um verdadeiro estado de caos social. Entendia que se as idéias religiosas não teriam mais forças para reorganizarem a sociedade, muito menos as idéias dos iluministas. Era extremamente impiedoso no ataque a esses pensadores, a quem chamava de “doutores em guilhotina”, vendo em suas idéias o “veneno da desintegração social”. Para ele, para haver coesão e equilíbrio na sociedade, seria necessário restabelecer a ordem nas idéias e nos conhecimentos, criando um conjunto de crenças comuns a todos os homens. Comte considerava como um dos pontos altos de sua sociologia a reconciliação entre a “ordem” e o “progresso”, pregando a necessidade mútua desses dois elementos para a nova sociedade.
Também para Durkheim (1858-1917) a questão da ordem social seria uma preocupação constante. De forma sistemática, ocupou-se em estabelecer o objeto de estudo da sociologia assim como indicar o seu método de investigação. Foi através dele que a sociologia penetrou a Universidade, conferindo a esta disciplina o reconhecimento acadêmico. Sua obra foi elaborada em época de crises econômicas constantes, quando o desemprego e a miséria provocava o acirramento das lutas de classe, com os operários utilizando a greve como instrumento de luta e fundando seus sindicatos. Vivendo nesta época em que as teorias socialistas ganhavam terreno, Durkheim não poderia ignorá-las, tanto é que em certo sentido, suas idéias constituíam a tentativa de fornecer uma resposta às formulações socialistas. Discordava das teorias socialistas mormente quanto à ênfase atribuída aos fatos econômicos para diagnosticar a crise das sociedades européias. Acreditava que a origem dos problemas não era de natureza econômica, mas originados na fragilidade da moral em orientar adequadamente o comportamento dos indivíduos.
Preocupado em estabelecer um objeto de estudo e um método para a sociologia, Durkheim, dedicou-se a esta questão, salientando que nenhuma ciência poderia constituir-se sem uma área própria de investigação. A sociologia deveria ocupar-se com os fatos sociais que se apresentavam aos indivíduos como exteriores e coercitivos. Isto quer dizer que o indivíduo quando nasce já encontra a sociedade formada criada pelas gerações passadas, cuja organização deverá ser transmitida às gerações futuras através da educação. O seu pensamento marcou decisivamente e sociologia contemporânea, principalmente as tendências que têm-se preocupado com as questões da manutenção da ordem social. A sua influência fora do meio acadêmico francês começou por volta de 1930, quando, na Inglaterra, dois antropólogos, Malinowski e Radcliffe-Brown, armaram a partir de seus trabalhos os alicerces do método de investigação funcionalista (busca de explicação das instituições sociais e culturais em termos da contribuição que estas fornecem para a manutenção da estrutura social). Nos Estados Unidos, a partir daquela data, as suas idéias começaram a ganhar terreno no meio universitário, exercendo grande fascínio em inúmeros pesquisadores. No entanto, foram dois sociólogos americanos Mertom e Parsons, em boa medida, os responsáveis pelo desenvolvimento do funcionalismo moderno e pela integração da contribuição de Durkheim ao pensamento sociológico contemporâneo, destacando a sua contribuição ao progresso teórico desta disciplina. A formação e o desenvolvimento do conhecimento sociológico crítico e negador da sociedade capitalista, sem dúvida liga-se à tradição do pensamento socialista, que encontra-se em Marx (1818-1883) e Engels (1820-1903) a sua elaboração mais expressiva. Estes pensadores não estavam preocupados em fundar a sociologia como disciplina específica. A rigor não encontramos neles a intenção de estabelecer fronteiras rígidas entre os diferentes campos do saber, tão ao gosto dos “especialistas” de nossos dias. Eles, em suas obras, interligavam disciplinas como antropologia, ciência política, economia, procurando oferecer uma explicação da sociedade como um todo, colocando em evidência as suas dimensões globais. Seus trabalhos não foram elaborados nos bancos das universidades, mas freqüentemente, no calor das lutas políticas.
A formação teórica do socialismo marxistas constitui uma complexa operação intelectual, na qual são assimiladas de maneira crítica as três principais correntes do pensamento europeu do século passado, tais como, o socialismo, a dialética e a economia política. O socialismo pré-marxista, também denominado “socialismo utópico”, constituía uma clara reação à nova realidade implantada pelo capitalismo, principalmente quanto às suas relações de exploração. Marx e Engels, ao tomarem contato com a literatura socialista da época, assinalaram as brilhantes idéias de seus antecessores sem deixarem de elaborar algumas críticas a este socialismo, a fim de dar-lhe maior consistência teórica e efetividade prática. Assinalavam que as lacunas existentes neste tipo de socialismo possuíam uma relação com o estágio de desenvolvimento do capitalismo da época, uma vez que as contradições entre burquesia e proletariado não se encontravam ainda plenamente amadurecidas. Atuavam os “utópicos” como representantes dos interesses da humanidade, não reconhecendo em nenhuma classe social o instrumento para a concretização de suas idéias. A filosofia alemã da época de Marx encontrara em Hegel uma de suas mais expressivas figuras. Como se sabe, a dialética ocupava posição de destaque em seu sistema filosófico. A tomarem contato com a dialética hegeliana, eles ressaltaram o caráter revolucionário, uma vez que o método de análise de Hegel sugeria que tudo o que existia, devido às suas contradições, tendia a extinguir-se. A crítica que eles faziam à dialética hegeliana se dirigia ao seu caráter idealista. Assim procuraram “corrigi-la “, recorrendo ao materialismo filosófico de seu tempo.
A intenção e conferir à sociologia uma reputação científica encontra em Max Weber (1864-1920) um marco de referência. Durante toda sua vida, insistiu em estabelecer uma clara distinção entre o conhecimento científico, fruto de cuidadosa investigação, e os julgamentos de valor sobre a realidade.
A busca de uma neutralidade científica levou Weber a estabelecer uma rigorosa fronteira entre o cientista, homem do saber, das análises frias e penetrantes e o político, homem de ação e de decisão comprometido com as questões práticas da vida. Essa posição de Weber, que tantas discussões têm provocado entre os cientistas sociais, constitui, ao isolar a sociologia dos movimentos revolucionários, um dos momentos decisivos da profissionalização dessa disciplina. A idéia de uma ciência social neutra seria um argumento útil e fascinante para aqueles que viviam e iriam viver da sociologia como profissão.
A sociologia por ele desenvolvida considerava o indivíduo e a sua ação como ponto chave da investigação. Com isso, ele queria salientar que o verdadeiro ponto de partida da sociologia era a compreensão da ação dos indivíduos e não a análise das “instituições sociais” ou do “grupo social”, tão enfatizadas pelo pensamento conservador.

História da Cidadania


Texto original de
JAIME PINSKY



Afinal, o que é ser cidadão?
Ser cidadão é ter direito à vida, à liberdade, à propriedade, à igualdade perante a lei: é, em resumo, ter direitos civis. É também participar no destino da sociedade, votar, ser votado, ter direitos políticos. Os direitos civis e políticos não asseguram a democracia sem os direitos sociais, aqueles que garantem a participação do indivíduo na riqueza coletiva: o direito à educação, ao trabalho, ao salário justo, à saúde, a uma velhice tranqüila. Exercer a cidadania plena é ter direitos civis, políticos e sociais, fruto de um longo processo histórico que levou a sociedade ocidental a conquistar parte desses direitos.
Cidadania não é uma definição estanque, mas um conceito histórico, o que significa que seu sentido varia no tempo e no espaço. É muito diferente ser cidadão na Alemanha, nos Estados Unidos ou no Brasil (para não falar dos países em que a palavra é tabu), não apenas pelas regras que definem quem é ou não titular da cidadania (por direito territorial ou de sangue), mas também pelos direitos e deveres distintos que caracterizam o cidadão em cada um dos Estados-nacionais contemporâneos. Mesmo dentro de cada Estado-nacional o conceito e a prática da cidadania vêm se alterando ao longo dos últimos duzentos ou trezentos anos. Isso ocorre tanto em relação a uma abertura maior ou menor do estatuto de cidadão para sua população (por exemplo, pela maior ou menor incorporação dos imigrantes à cidadania), ao grau de participação política de diferentes grupos (o voto da mulher, do analfabeto), quanto aos direitos sociais, à proteção social oferecida pelos Estados aos que dela necessitam.
A aceleração do tempo histórico nos últimos séculos e a conseqüente rapidez das mudanças faz com que aquilo que num momento podia ser considerado subversão perigosa da ordem, no seguinte seja algo corriqueiro, “natural” (de fato, não é nada natural, é perfeitamente social). Não há democracia ocidental em que a mulher não tenha, hoje, direito ao voto, mas isso já foi considerado absurdo, até muito pouco tempo atrás, mesmo em países tão desenvolvidos da Europa como a Suíça. Esse mesmo direito ao voto já esteve vinculado à propriedade de bens, à titularidade de cargos ou funções, ao fato de se pertencer ou não a determinada etnia etc. Ainda há países em que os candidatos a presidente devem pertencer a determinada religião (Carlos Menem se converteu ao catolicismo para poder governar a Argentina), outros em que nem filho de imigrante tem direito a voto e por aí afora. A idéia de que o poder público deve garantir um mínimo de renda a todos os cidadãos e o acesso a bens coletivos como saúde, educação e previdência deixa ainda muita gente arrepiada, pois se confunde facilmente o simples assistencialismo com dever do Estado.
Não se pode, portanto, imaginar uma seqüência única, determinista e necessária para a evolução da cidadania em todos os países (a grande nação alemã não instituiu o trabalho escravo, a partir de segregação racial do Estado, em pleno século XX, na Europa?). Isso não nos permite, contudo, dizer que inexiste um processo de evolução que marcha da ausência de direitos para sua ampliação, ao longo da história.
A cidadania instaura-se a partir dos processos de lutas que culminaram na Declaração dos Direitos Humanos, dos Estados Unidos da América do Norte, e na Revolução Francesa. Esses dois eventos romperam o princípio de legitimidade que vigia até então, baseado nos deveres dos súditos, e passaram a estruturá-lo a partir dos direitos do cidadão. Desse momento em diante todos os tipos de luta foram travados para que se ampliasse o conceito e a prática de cidadania e o mundo ocidental o estendesse para mulheres, crianças, minorias nacionais, étnicas, sexuais, etárias. Nesse sentido pode-se afirmar que, na sua acepção mais ampla, cidadania é a expressão concreta do exercício da democracia.
Apesar da importância do tema e do significado da discussão sobre a cidadania não tínhamos, até agora, um livro importante sobre o tema, razão pela qual há cerca de dois anos começamos a organizar uma obra consistente sobre a história da cidadania. Inicialmente pensamos que a carência bibliográfica era apenas um problema brasileiro, mas aos poucos fomos percebendo que era um fenômeno mundial. Não havia, simplesmente, um grande livro sobre a história da cidadania. Quem quer que escrevesse sobre o assunto recorria ao sociólogo inglês T. H. Marshall, autor de um texto básico, mas que não tinha a pretensão de ser uma história da cidadania. De resto, achamos importante mostrar que a sociedade moderna adquiriu um grau de complexidade muito grande a ponto de a divisão clássica dos direitos do cidadão em individuais, políticos e sociais não dar conta sozinha da realidade.
Nossa proposta foi a de organizar um livro de história social, no sentido de não fazer um estudo do passado pelo passado, muito menos do passado para justificar eventuais concepções pré-determinadas sobre o mundo atual. Queríamos, isto sim, estimular a produção de textos cuidadosamente pesquisados, mas que se propusessem a dialogar com o presente. Não é por acaso que os textos dão conta de um processo, um movimento lento, não linear, mas perceptível, que parte da inexistência total de direitos para a existência de direitos cada vez mais amplos.
Sonhar com cidadania plena em uma sociedade pobre, em que o acesso aos bens e serviços é restrito, seria utópico. Contudo, os avanços da cidadania, se têm a ver com a riqueza do país e a própria divisão de riquezas, dependem também da luta e das reivindicações, da ação concreta dos indivíduos. Ao clarificar essas questões, este livro quer participar da discussão sobre políticas públicas e privadas que podem afetar cada um de nós, na qualidade de cidadãos engajados. Afinal, a vida pode ser melhorada com medidas muito simples e baratas, ao alcance até de pequenas prefeituras, como proibição de venda de bebidas alcoólicas a partir de certo horário, controle de ruídos, funcionamento de escolas como centros comunitários no final de semana, opções de lazer em bairros da periferia, estímulo às manifestações culturais das diferentes comunidades, e muitas outras. Sem que isso implique abrir mão de uma sociedade mais justa, igualitária, com menos diferenças sociais, é evidente.
História da Cidadania já surge, portanto, como obra de referência. Ao organizar a discussão sobre um assunto de que tanto se fala e tão pouco se sabe, ao estimular a produção de textos de intelectuais de alto nível, o livro dá conteúdo a um conceito esvaziado pelo uso indevido, e propicia uma reflexão sólida e conseqüente.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

O cursinho foi reprovado Publicado em 06.02.2010

O cursinho foi reprovado Publicado em 06.02.2010
Agora que os resultados do Exame Nacional de Ensino Médio (Enem) viram passaporte carimbado para o ingresso em pelo menos 51 universidades públicas do País, os donos da indústria de escolas de ensino privado se perguntam com será possível sobreviver a partir do evento quando os alunos treinados em suas salas de aulas não conseguiram as melhores colocações das universidades de seus Estados. E o mais grave: a maioria nem sequer conseguiu vaga.Não foi apenas o sistema de acesso à universidade pública que mudou. Isso se deu no começo do ano com a elevação da importância do Enem pelo governo Lula. O que foi para o espaço esta semana foi o modelo de negócios em que ancora a indústria cujo faturamento é estimado em R$ 45 bilhões em 2008 e que simplesmente não podem mais garantir aos alunos de seus Estados a perspectiva de uma aprovação no topo da lista. Na verdade, eles já não podem mais nem oferecer a perspectiva de aprovação.A pergunta é dramática para as empresas de ensino pois, a partir desta segunda-feira, milhares de país e alunos vão acordar se perguntando se vale apenas investir tanto dinheiro e esforço se a prova do Enem pode classificar um aluno de um outro Estado. E o que a escola vai dizer ao seu freguês diante de resultados tão pífios se comparados com os do ano passado. Tem mais: como ficará a moral dos alunos da rede pública que, nos últimos anos, chegavam às universidades públicas graças ao reforço gratuito dadas por professores cuja motivação era provar que o aluno da escola pública ainda podia sonhar com um diploma. E sem ter que recorrer às cotas.» Escolas reconhecem desafioO diretor do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino no Estado de Pernambuco, José Ricardo Diniz, reconhece que as escolas estão diante de um desafio e terão que reavaliar seu planejamento e estratégia de negócios quando o ano letivo já começou. Ele admite que os resultados obtidos vão suscitar uma série de debates porque o Enem tornou a disputa nacional. Ele adverte para os reflexos que o modelo terá nas universidades criadas no governo Lula, cujo foco era gerar novos pólos universitários no interior do País.» RegionaisA questão das regionais é, certamente, a que mais provoca dúvidas. Instituições como a Univasf já não asseguram que os alunos residentes na região terão a chance de cursar uma universidade pública. Ou qual é o compromisso que um aluno emigrante terá com a região.» VocaçõesO governo Lula criou 13 novas universidades, cujo foco era abrir oportunidades e descentralizar a graduação, além de formar alunos em cursos com as vocações da região. O Enem mostrou alunos migrando para campus em cidades que nunca ouviram falar. » Resultado ruimNo caixa das escolas privadas os resultados do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) podem provocar um efeito devastador. Instituições que criaram suas marcas e montaram estruturas educacionais em função dos resultados nos exames das universidades locais já sabem que a safra 2010 não foi tão boa.» CompetiçãoO negócio terá que ser revisto. O aluno sabe que não disputa mais na cidade. Isso significa disputar não com três, mas com três mil. Na UFPE, pela primeira vez entre os 10 melhores, não tem um aluno de Medicina. O que dizer aos pais que investiram pesado para levar o filho a uma federal do Estado?» Cotas reduzem chancesO sistema deve provocar mudanças de abordagem, também, em relação às cotas. Além de disputar a vaga nacionalmente, o aluno de escola privada está vendo que só poderá disputar metade das vagas federais.» Competir com rede públicaNa prática, isso quer dizer que a diferença entre as notas poderá tornar a vaga inacessível. Além disso, as cotas poderão levar para universidades alunos da rede pública de outro Estados, desestimulando os alunos locais.» FaturamentoO negócio cursinho virou um negócio bilionário, que evoluiu para escolas de segundo grau e universidades particulares. Os dados disponíveis revelam que ele é estimado em R$ 45 bilhões/ano. Mas o foco e toda a estratégia de marketing é para a competição no mercado local.» ConcentraçãoO novo cenário pode levar as grandes empresas a ter abordagens nacionais para competir nacionalmente. Mega redes com o discurso de aprovação em todos os Estados. E nesse caso, as empresas de Estados menores terão menos chances de aprovar seus alunos.

Charge da semama : O conflito